“(…) No âmbito das famílias, a violência acontecia nos marcos do contrato sexual e social. Não conheço, no contexto da Casa-Grande e da Senzala, registro de mulheres que vieram a público para denunciar seus maridos por estupro. O que quer um homem quando mantém relações sexuais não consentidas? Utiliza-se frequentemente a noção de “objeto” para se referir a esses “vínculos”. Ou seja, não se trata de dois sujeitos de vontade, autoconscientes de seus direitos e que, por atos de reconhecimento recíprocos, se encontram na esfera do desejo compartilhado. É o desejo de um que se sobrepõe ao outro. No entanto, a noção de “objetificação” alcança o que acontece na relação entre homem livre/mulher escravizada? Tenho como hipótese que precisamos acionar conceitos distintos para ler o que acontece nessas cenasTentarei fazer uma articulação incomum dos conceitos de reificação, conforme proposto por Axel Honneth (2019), e abjeção, nos marcos das reflexões de Judith Butler (2021) (…) ” (Berenice Bento. Artigo: Quantos estupros contém a palavra “estupro’?, in: “Violência sexual e racismo: ensaios e debates interseccionais”, livro organizado por Bruno A. Machado e Mariana Fernandes Tavora)